Diário de um missionário
Missão África 2018 Diário 7 e último:
Olá queridos, (em português porque ja estou a caminho de casa)
“A maior honra que podemos dar ao Deus Todo-Poderoso é viver com alegria pelo conhecimento do seu amor”. (Brennan Manning em O Evangelho Maltrapilho) Quando cheguei no continente Africano encontrei um passado trágico, cheio de imposições segregacionais, marcado por uma colonização cruel. Mas não encontrei tristeza. Encontrei fé, alegria, dança e muitas vozes lindas. O amor nos faz alegres e a fé nos faz acreditar no amor a cada manhã. E foi assim que passei os 15 dias mais intensos e reflexivos da minha vida. Me importando com o próximo e sem tempo para vaidades. Tempo de qualidade e crescimento.
Começamos a noite com um jantar especial, quero deixar registrado que amei a comida africana. Então tivemos o privilégio de reunidos em volta da mesa poder ouvir o testemunho de vida do Ben, não vou conseguir reproduzir aqui 2h de histórias sobre o genocídio e de como o Ben conseguiu salvar sua vida e de alguns parentes. Fica para um café. Mas adianto que infelizmente seu pais, alguns irmãos e sua noiva foram violentamente mortos. É uma história dura, triste, violenta, mas de superação e fé. O Ben é um ativista na causa da imortalidade da lembrança do genocídio, ajudando na construção de memoriais, para que todos, principalmente a nova geração não se esqueça do que aconteceu e o erro nunca mais se repita. A fé desse homem nos inspirou nessa noite e transformou minhas grandes mazelas em coisas muito efêmeras. Então lembrei de Provérbios 4:23, meu versículo preferido, que diz “Sobre tudo que se deve guardar, guarda o teu coração pq dele provem as fontes da vida”. Se o Ben não tivesse guardado o coração, teria se revoltado, teria sede de vingança e não teria paz. Mas ele escolheu o caminho do amor, trazendo palavras de amor e fé a vida de tantos sobreviventes que estavam mortos e destruídos após tanta barbarie.
Então vamos ao nosso último dia de atendimentos, com os materiais ja escassos por causa da jornada. Orlando, o dentista que estava fazendo as triagens veios nos contar de uma criança cheia de cáries no dentes superiores anteriores (12, 11, 21, 22). Tínhamos naquele momento o motorzinho (caneta de alta rotação) para limpar as cavidades, mas aquela luz azul (fotopolimerizador) que usamos para fazer restaurações com resina queimou no Congo, na tentativa de acertar a voltagem dos geradores de energia que são muito instáveis. Me vi diante do impasse: deixar uma criança de 12 anos perder os 4 dentes permanentes ou tentar restaurar com um material impróprio para a estética por ser muito fluido para escultura dental. Decidi encarar o desafio e fiquei por 2h em pé pedindo a Deus que não deixasse o material acabar, e foi a conta de terminar as 4 restaurações, como Deus é perfeito! Demos o espelho para o Efranis e ele ficou paralisado por um momento, depois se emocionou fazendo todos ali ficarem sem palavras. O momento em que me senti fazendo a diferença na vida de alguém.
É o dia o último dia, e por mais que eu não goste de despedidas, é irremediável viver esse momento. No diário 2, contei para vocês a história da Jessica. E nesse tempo posso dizer que nos tornamos amigas. Achei que ela não teria tempo para se despedir de mim, então ela apareceu no finalzinho da manhã com uma cartinha e para minha surpresa em português (google translater). Mais emoção caindo dos olhos e escorrendo pelo rosto.
Foi um longo dia. Acordei um tanto triste porque é o dia de dizer tchau as pessoas que aprendi amar. Não sou uma pessoa que chora com facilidade, mas nessa viagem me tornei quem eu mais criticava (haha). Chorei no café da manhã dizendo algumas palavras sobre a bondade de Deus e sua graça manifestada naquele lugar. Então pela primeira vez fomos fazer uma refeição fora dos nossos alojamentos. Foi um momento de comunhão, de reconhecimento das pontes construídas. Tínhamos todos motivos para não nos tornamos unidade, cada um de um lugar do mundo, mas apredemos a nos amar, não importando a barreira cultural e da língua. E tirando fotos segurando a bandeira de Rwanda prometemos nos encontrar novamente, na África, na Escócia, na Inglaterra ou no Brasil!!!
Eu não contei para vocês a história do menino Uwezo, porque os diários estavam ficando muito grandes. Mas quando estivemos no Congo encontramos essa criança de 4 anos com um tumor no olho esquerdo. À equipe médica não tinha o que fazer e sem recursos o encaminharam. Mas o pai não tinha como custear à viagem e a cirurgia. Então por iniciativa da Carey, fizemos uma vaquinha. Recebi a notícia de que ele foi operado ontem e o tumor foi totalmente removido junto com seu globo ocular. Graças a Deus o tumor não tinha se espalhado para nenhuma outra parte do corpo. Estamos muito felizes!!!
Edilene é uma psicóloga da nossa equipe e antes de embarcar para a missão, teve problemas familiares sérios e por isso decidiu desistir e enviar o dinheiro que gastaria na viagem para ajudar o projeto. Quando comunicou a seu apadrinhado na África que faria isso, o menino Didier respondeu: Mãe, se não vier me conhecer, não precisa mandar mais nenhum dinheiro! Então ela entendeu o tamanho do amor que a esperava aqui.
Quero terminar esse diário dizendo que a missão não é só para equipe médica. NA MISSÃO TEM LUGAR PARA TODOS. Se quiser se envolver indo em alguma missão para levar amor a essas pessoas ou adotar uma criança de rua contribuindo mensalmente é só entrar em contato por WhatsApp com o Comfort Internacional através do numero +55 61 99162-3713.
Estou muito feliz e nunca me senti tão realizada. Essa felicidade se da pela fé; pela pessoa que me tornei nesse lugar; pelas orações de vocês me sustentando aqui; pelas doações que trouxemos e pela ajuda financeira (que sem ela eu não estaria aqui) de pessoas muito especiais e generosas que eu não poderia deixar de citar: Marianne, André F, Pedro, Sayonara, Libia, Alexandre, Tio Geraldo, Tia Fernanda, Thiago, Natália, Alessandro, Beto, Hilda, Bruno D, Murillo, Bruno M, Emanuel, Hadassa, Antônio, André S, Amanda, Cristiano, Lezimara, Fabio, Rodrigo e todas pessoas que ajudaram incentivando e amando esse projeto comigo.
“Quanto a mim, que eu jamais me glorie, a não ser na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo, por meio da qual o mundo foi crucificado para mim, e eu para o mundo.” (Gálatas 6:14)
Com amor,
Nathália Dornellas Johannesburgo, 14 set 2018.